360 graus.
- Disse alguma coisa, amigo? - Santiago olhou-o pelo retrovisor, assim que parou em frente a um sobrado verde claro de aparência antiga, cuja data de construção era talhadamente destacada por uma luz de 60 watts amarelada. "1912".
Miranda havia informado o número errado. Preferiu que o deixasse duas ruas antes, para que ele não soubesse onde era sua morada. De qualquer forma, o que adiantaria ele saber ou não? Não interessava. Estava mergulhando numa paranóia absoluta e incurável. Sentia aversão ao outro e não queria qualquer forma de contato afetivo. Por quanto tempo viveria como Nietzsche ou Schopenhauer?
- Obrigado. - Saiu do carro sem olhar pra trás. Miranda ficou parado em frente ao sobrado pegou as chaves no bolso, e fingiu que abria o cadeado. O carro de Santiago não se moveu. Miranda virou-se e foi até a janela do carona. - Qual o seu problema, cara? Deixe-me em paz. Acredito que já tive demais por essa noite. Agora vá que você vai acordar a minha avó doente fazendo esses cachorros latirem!
Santiago tragava um cigarro que acabara de acender e corou com a retórica de Miranda. Sentiu-se incomodado com a acrimônia de suas palavras e resolveu dar partida. Engatou a primeira marcha enquanto Miranda se virava para continuar sua farsa infantil.
Esperou o carro virar a esquina e começou a caminhada de duas ruas até a casa. Em meio a passos sem muita firmeza, Miranda devaneava sobre o seu dia e fazia um retrospecto desde o dia em que o seu pai havia morrido, até a clipagem de um aneurisma da mãe. - Quantas mortes! Pelo visto eu sou o próximo. - instintivamente olhou pra trás e procurou alguém e não viu nada, apenas gatos na espreita brincando de acasalar com seus uivos desafinados.
"Devemos encarar com tolerância toda loucura, fracasso e vício dos outros, sabendo que encaramos apenas nossas próprias loucuras, fracassos e vícios." - Repetiu essa frase de Schopenhauer quinze vezes durante todo o caminho, até colocar a chave na fechadura.
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